Histeria Masculina

HISTERIA.

Histeria e Depressão.

A associação dos quadros histéricos com a Depressão é cada vez mais contundente. A Depressão é um dos diagnósticos psiquiátricos mais comumente associados à histeria nas últimas pesquisas. Estima-se em que seja em torno de 38% o número de pacientes histéricos do tipo conversivo que sofrem de Depressão (Marjama J, Troster AI, Koller WC, Psychogenic Movement Disorders. Neurologic Clinics 13:283-297,1995).
Esta relação é ainda maior quando o transtorno histérico é do tipo somatização. Chega em torno de 90% o número de pacientes com esse quadro que desenvolverão um episódio de Depressão Maior ao longo da vida (Ford Blair, Treatment of psychogenic movement disorders, Columbia College of Physicians, Center for Parkinson´s disease and movement disorders, New York, NY).
Para entender melhor como ocorre a concordância entre depressão e histeria, vamos considerar o seguinte: os quadros do espectro histérico (conversão, dissociação, somatização, etc) podem ser todos considerados como tendo origem reativa, ou seja, aparecem como uma reação a eventos, sentimentos e emoções. Mas, para se manifestar, a histeria necessita previamente de um marcante traço histriônico de personalidade. Resumindo, vamos dizer que a química para a histeria seria um traço histriônico de personalidade, juntamente com uma reação emocional exuberante à alguma vivência.
Isso significa que não basta o traço histriônico para fazer aparecer o quadro histérico, se não houver uma reação vivencial exuberante, se não houver uma vivência emocional exageradamente significativa (para a pessoa).
Ora, sabendo que as pessoas com tonalidade afetiva depressiva sentem os estímulos aversivos, as dificuldades existenciais e os conflitos com muito mais intensidade, podemos supor que se essas pessoas estão sujeitas a reagirem à vida, de um modo geral, com muito mais sentimentos.
Juntando-se agora, a extrema sensibilidade vivencial das pessoas com tonalidade afetiva depressiva e a eloqüência de reações das pessoas histriônicas, podemos supor que os histéricos estão assim devido a uma reação vivencial exagerada aos estímulos aversivos, às dificuldades existenciais e conflitos.
Caso ainda esteja difícil relacionar as crises do espectro histérico à depressão, vamos raciocinar ao contrário: a pessoa não terá uma crise histérica se não reagir exageradamente ao estímulo, ela não reagirá exageradamente ao estímulo se não tiver uma grande sensibilidade afetiva a esse estímulo e não terá uma crise histérica se não tiver um traço histriônico em sua personalidade. Assim sendo, podemos considerar a histeria como uma das manifestações depressivas em personalidades cujo traço histriônico seja proeminente.

A Histeria nos Homens.

A análise etimológica da palavra histeria nos traz ecos das superstições do passado. Como vimos, não foram poucos os que disseram que só mulheres poderiam ser histéricas e que era rematado absurdo falar-se em histeria masculina, uma vez que, etimologicamente, o vocábulo vem de "hyster", Grego para "útero".
Na realidade, o vocábulo não nos diz nada sobre a doença, mas sim sobre o estágio da Medicina na época em que o nome foi cunhado, muitos e muitos séculos antes de Freud. Antes de Freud e Charcot, acreditava-se que os sintomas descritos como histéricos eram causados por uma mirabolante migração uterina, estando assim a doença anatomicamente vinculada às mulheres.
Durante muitos séculos, a histeria não era somente uma queixa feminina. Ela foi atribuída a uma espécie de manifestação da fraqueza moral da mulher, como parte de sua habilidade em mentir, sua imaturidade, seus caprichos e lágrimas e necessidade de chamar a atenção. "Como regra geral, todas as mulheres são histéricas," escreveu o médico francês Auguste Fabre em 1883, acrescentando... "O que constitui o temperamento de uma mulher é basicamente a histeria".
Se, no tempo de Platão, o útero provocava nas mulheres um vivo desejo de gerar filhos e que, passando as épocas férteis e não se dando a concepção, este útero desapontado "começava a irritar-se perigosamente, se agitando em todas as direções, no corpo da mulher, ocasionando doenças de todos os tipos", hoje a maioria dos estudiosos desvincula a doença da esfera feminina.
Prefere-se estudar a histeria na esfera da mente, independente do gênero, podendo, assim, falar de homens histéricos. O vocábulo claramente perdeu qualquer relação com o significado etimológico de seus componentes e, embora o caráter histérico seja mais freqüente nas mulheres, os homens também podem ser acometidos pelo histrionismo.
Há até quem conteste a supremacia feminina em relação a esse traço do existir humano e, de fato, se considerarmos que os homens histéricos podem manifestar essa mazela de forma diferente e atípica, aí então a casuística ficaria praticamente igual.
Por estar a neurose histérica tão fortemente atrelada ao sexo frágil, passou a ser um verdadeiro insulto rotular um homem de histérico. Assim sendo, o chamado sexo forte passou a esconder sua histeria em sintomas algo diferente da teatralidade feminóide. Para os homens, parece que a necessidade de alguma vivência desencadeadora do rompante histérico é imprescindível. Quanto mais traumática for a vivência pré-surto histriônico, mais aliviado o histérico se sente em seus pruridos masculinos.
A etiqueta diagnóstica do Transtorno de Estresse Pós-Traumático parece atender alguns casos de histeria masculina, onde os sintomas podem ser muito parecidos aos da histeria feminina, incluindo as paralisias, anestesias, etc. Estes sintomas masculinos seriam ainda acrescidos de honrosas preocupações hipocondríacas, com medos de afecções cardíacas, palpitações, dores diversas e vertigens.
Há também no histérico masculino uma preocupação pela boa aparência, um zelo especial para com os gestos, com o modo de falar, comportamento, roupas, penteados, da mesma forma que na mulher. O desejo de agradar a todos domina sua vida e é inconsciente. Isso o torna tão sedutor como a histérica mulher.
Há estudos mostrando que 75% das pessoas adultas e sadias sofrem algum tipo de dor ou de mal estar num prazo de uma semana. Isso quer dizer que, em condições normais, o ser humano costuma apresentar alguma queixa sobre si mesmo e isso não se constitui em nenhum transtorno psiquiátrico (White KL, Williams TF, Greenberg BG. The ecology of medical care. N Eng J Med 1961; 265: 885-892). Entretanto, devemos pensar num diagnóstico de Somatização, apenas quando a pessoa que se queixa acredita estar sofrendo de um problema orgânico e busca diagnóstico e tratamento médico persistentemente. Nesses casos parece haver uma relutância do paciente em aceitar as seguidas negativas dos médicos quanto a possibilidade de não haver nenhuma doença física.
A diferença entre os Transtornos Somatomorfos e as Doenças Psicossomáticas está não fato dessas últimas comportarem, junto com a queixa, realmente alguma alteração orgânica constatável clinicamente, enquanto a somatização não. Assim sendo, havendo confirmação de alterações orgânicas e, sendo a doença em pauta influenciável (determinada ou agravada) por razões emocionais, estamos diante de Doenças Psicossomáticas. Alguns poucos exemplos desses transtornos podem ser: asma brônquica, hipertensão arterial essencial, psoríase, retocolite ulcerativa, entre muitas outras.

O Lucro (emocional) da Histeria.

O fenômeno do benefício emocional, primário e secundário, observado em todas as neuroses, é particularmente notável na histeria. Portanto o meio cultural mais exuberantemente impregnado de superstições, crenças mágicas, possessões e demônios, pecados e castigos, e toda sorte de elementos sobrenaturais irá influenciar enormemente na proliferação dos sintomas da histeria.
Curiosamente, atestando que não é a natureza emocional do ser humano que depende da cultura, mas sim sua forma de manifestação e sintomatologia, à medida que aumenta o nível cultural, a crítica social e a resistência à sugestão e às influências, embora diminuam os casos de histeria, os distúrbios psicossomáticos aumentam (veja mais à frente).
Na histeria, sempre que o sintoma servir para o alívio da ansiedade, há um mecanismo ao qual chamamos de Lucro Emocional Primário. Diante de um conflito, normalmente proporcionado pela discrepância entre aquilo que o histérico quer fazer com aquilo que ele deve fazer, ou ainda, com aquilo que ele consegue fazer ou com a situação que está acontecendo, o sintoma histérico aparece para proporcionar algum alívio.
Uma adolescente conversiva, por exemplo, diante de uma situação vivencial potencialmente ansiosa, como pode ser o caso de uma briga entre seus pais, recorre à uma síncope conversiva (desmaio). Com isso, certamente estará se afastando da situação traumática e se protegendo da ansiedade provocada pela briga. Também um soldado com Transtorno Conversivo, diante da ansiedade produzida pelo conflito entre o medo do combate e a vergonha da fuga, poderá apresentar uma paralisia ou qualquer outra limitação neuromuscular; sendo um deficiente físico, não terá que experimentar a ansiedade de saber-se um covarde já que, infelizmente, a natureza impediu sua participação no combate através de uma doença limitante de sua mobilidade.
Num outro mecanismo, a pessoa histérica obtém um Lucro Emocional Secundário, ou seja, conquista um suporte de aprovação, complacência ou compaixão do ambiente para com sua eventual falha ou para a não realização da atividade que lhe é avessa. A mesma adolescente que manifestou uma síncope ao presenciar a briga de seus pais, citada no exemplo anterior, despertará sentimentos de remorso nas pessoas responsáveis pela sua crise, juntamente com uma compaixão pelo seu estado deplorável e, inevitavelmente, receberá uma boa dose de carinho em seguida.

Dependência Emocional e Centro das Atenções.

Observa-se em algumas pessoas histéricas uma acentuada dependência emocional de outra(s) pessoa(s) íntimas, seja do companheiro(a), do(s) filho(s) ou dos pais. Por causa dessa característica a pessoa histérica condiciona seus sintomas, crises e queixas ao estado da pessoa de quem dependem emocionalmente.
Percebendo que existem riscos da pessoa de quem dependem envolver-se com outras preocupações que não a pessoa do histérico, essa pode entrar em crise. É o que acontece com muitas mães histéricas ao perceberem que não estão sendo os alvos principais de atenção dos filhos, quando esses planejam sair de casa, casar-se, viajar, etc. Acontece também quando percebem que o(a) esposo(a) não tem-lhes dado a atenção pleiteada.
Notamos também essa característica de dependência das pessoas histéricas em relação aos outros, quando elas parecem despojar-se de qualquer pensamento ou decisão pessoal. O discurso dessas pessoas dá-nos a impressão que elas são marionetes nas mãos dos demais (quando na realidade é exatamente o contrário); ... eles acharam que eu deveria procurar um médico.... eles me levaram ao pronto socorro... eles me acharam doentes... Sempre são “eles” quem tomam decisões, parecendo que o histérico está imune e à margem de seu destino.

Sugestionabilidade e Teatralidade.

Sem dúvida, a sugestionabilidade é um dos traços mais marcantes da personalidade histérica. É sobejamente sabido da atração que as profissões médicas ou paramédicas exercem sobre os histéricos. Muitas vezes ouvimos de pessoas histéricas frases do tipo: “...doutor, o senhor tem uma das profissões mais bonitas. Eu sempre quis estudar medicina...”, “... doutor, só de falar com o senhor já sinto alívio...”
Os histéricos, de um modo geral, são extremamente sugestionáveis, demonstrando com isso seu clássico infantilismo e falta de maturidade da Personalidade. Eles têm os afetos e as relações interpessoais pueris, com predomínio da vida em fantasia como tentativa de negar uma realidade frustrante e penosa.
No campo terapêutico, essa característica pode ser benéfica, já que esses pacientes se tornam dependentes de seu médico e sujeitos a verdadeiras curas milagrosas que ocorrem por pura sugestão. O lado ruim, é que podem sentir todos efeitos colaterais dos medicamentos, complicando a adesão ao tratamento.
A marcante teatralidade e sugestionabilidade dos histéricos, juntamente com a divulgação freqüente feita pela literatura e pelo cinema sobre temas médicos, fazem com que a medicina ofereça sempre um valioso suporte alternativo para os fracassos, angústias, carências e fantasias da histeria. Essa teatralidade é muito marcante, fazendo com que eles estejam sempre ensaiando e interpretando papéis que acredita adequados à si próprios. Por mais que lhe sejam dispensados carinhos a atenções, estes nunca são suficientes. Insistentemente as pessoas histéricas estão a reclamar que ninguém as entende.

A indiferença aos Sintomas.

La belle indiference é o nome que se dá quando o paciente não demonstra preocupação com o que parece ser um prejuízo maior. Nessa indiferença o histérico pode relatar, tranqüilamente, que está cego. A intencionalidade do histérico com essa indiferença sobre seu estado é no sentido de, sendo vítima, aceitar placidamente esse destino cruel.
O paciente se comporta, às vezes, como se falasse dos sintomas de outra pessoa. Após queixar-se deles com veemência, passa a abordar outros acontecimentos de sua vida atual ou passada, como se tivesse esquecido o início da conversa e de seu sintoma principal. Curioso é que quanto mais o médico se desvia dos sintomas físicos mais a pessoa histérica o acompanhará e, ao contrário, quando retorna a abordar os sintomas e lhes damos muita atenção, observa-se um agravamento dos mesmos.
A belle indiference constitui uma fragrante dissociação entre a reação emocional esperada e o transtorno apresentado pelo histérico. Um dos propósitos desse sintoma na histeria é fazer com que a pessoa assuma o papel de vitima indefesa diante da situação, provocando sentimentos de dó, pena e complacência dos outros. De fato, um dos males viciosos da histeria é o fato da pessoa ir incorporando este sentimento de fragilidade interior, o qual fará com que vá se sentindo cada vez mais fraca e incapaz.



Informação tirada do site: http://www.psiqweb.med.br/site/?area=NO/LerNoticia&idNoticia=71

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